Jogadores Proativos x Jogadores Reativos

“O que vocês fazem”, pergunta o Mestre, e os jogadores se sentem perdidos no jogo, sem saber o que exatamente seus personagens farão até que uma aventura, missão ou tarefa esteja evidente para o grupo.

É comum que muitos jogadores estejam acostumados a esperar que o Mestre coloque desafios, tarefa ou simples acontecimentos diante dos Personagens dos Jogadores. É um jeito mais simples de jogar, e é até mesmo natural que assim seja, afinal amigos se reúnem para rolar dados e vivenciar situações de jogo incomuns, e é o papel do Mestre criar e expor tais situações.
Porém, que dificuldades jogadores que esperam incentivo trazem ao jogo, e quais vantagens de ser um jogador pró-ativo?

Primeiramente, penso que inícios de campanhas naturalmente fazem os jogadores esperarem incentivo, mesmo os pró-ativos, devido à ausência de familiarização com o cenário, as regras, ou simplesmente os personagens dos demais jogadores. Assim, o que exponho neste post são atitudes no decorrer de uma campanha.
Passada a assimilação inicial dos jogos, os jogadores deveriam ter objetivos definidos para seus personagens, e uma personalidade ao menos superficialmente estipulada para imaginar o que seu respectivo personagem costuma fazer. Assim, em momentos entre-aventuras, quando não há nenhum desafio ou missão claro, o PJ deveria ter algo a fazer, seja afiar as armas, tratar de seu cavalo, escrever seu diário, etc. Mesmo em grupos que não valorizam muito os tais momentos entre-aventuras, dizer para o mestre que o personagem vai até a taverna ou pub local analisar o ambiente e tentar colher algumas informações sobre acontecimento recentes na cidade pode se mostrar um bom meio de movimentar o jogo. Esses são personagens pró-ativos.
Quando digo que deveriam, não quero afirmar que esta é uma regra a se seguir por jogadores. Antes disso, pretendo apenas destacar o quão facilitador são jogadores pró-ativos.
Se um grupo prefere jogar com seus jogadores recebendo uma missão a se realizar do mestre, sem se preocupar com que ganho leva-os a aventura, não há porque mudar esta maneira de jogar. Mas a maioria dos grupos, imagino, valorizam também momentos fora das aventuras, e gostam de ser “fisgados” para a próxima aventura de maneira natural e verossímil.
Criar bons ganchos de aventuras é bastante trabalhoso para Mestres, afinal pensar que os jogadores invadirão a torre do necromante Valdavulk, passarão por diversos desafios e enfrentarão os servos mortos-vivos que guardam o local, até finalmente encontrar o cajado do Senhor dos Mortos é relativamente simples... Agora pensar em bons motivos para os PJs dos jogadores se interessarem pelo objeto é algo bem mais complexo.
É a partir disso que jogadores que buscam desafios, ou que simplesmente agem por conta própria com seus personagens facilitam o trabalho. Se após anunciar os vários “o que vocês fazem” o Mestre não obteve grandes atitudes dos jogadores, que mantém-se nas atividades corriqueiras e despreocupados em interepretar a cena, ele se sentirá na obrigação de colocar algo que movimento o jogo, que instigue emoção nos jogadores, e o fará de súbito.

“Fico ali até algo acontecer”
Os PJs estão na taverna de um vilarejo no caminho da capital onde precisam encontrar um clérigo misterioso que enviou-lhes uma carta dizendo ter uma missão ao grupo. Se nada fazem, logo o Mestre anuncia um assalto, o pedido do taverneiro para que enfrentem os orcs que assaltam as caravanas de mercadorias que chegam à cidade, etc. No décimo vilarejo –porque estipular que os PJs fazem o mesmo em todos os locais, e “pular” o jogo até o destino subaproveita o pontencial das viagens, começa a se tornar monótono como indivíduos vêm pedir ajuda aos PJs, ou como simplesmente nada ocorre.
Ao invés disso, se parados no vilarejo o guerreiro do grupo procura os guardas da milícia local para perguntar se algum monstro costuma atacar a região, se o mago caminha despreocupadamente pelo bosque local em busca de ervas e plantas úteis como componentes a suas magias, qualquer acontecimento a partir disso, como o monstro que os guardas citam atacar o mago repentinamente – parecerá ter ocorrido porque os foram atrás de algo. Ocorrendo desta maneira, dissipa-se a impressão de que o mundo gira em torno dos PJs, afinal ao invés de eles nada fazerem (“não faço nada demais até que algo aconteça”) e algo acontecer, foi sua atitude que ocasionou algum acontecimento.

Holofotes no jogo
Outra questão comum entre a diferença de jogadores pró-ativos e que esperam incentivo, é o quanto personagens destes dois tipos de jogadores aparecem no jogo.
Claro que o Mestre deve entender quando um jogador é tímido e não consegue interpretar ou mesmo pensar no que seu personagem faria. O Mestre deve, inclusive, colocar acontecimentos envolvendo esse personagem para dar oportunidade dele interpretar e assimilar melhor o personagem, o jogo e o conjunto de regras, além de fazer, com isso, que o personagem faça algo. Porém, ter vários jogadores que esperam incentivo na mesa dificulta muito, e chega uma hora que fica difícil pensar em algo para os personagens deles.
Se o mago do grupo não está se destacando em nenhuma aventura porque o jogador limita-se a lançar as magias quando necessário, analisar itens mágicos quando pedem para fazê-lo, o Mestre bola um encontro em uma aventura onde uma esfinge faz um enigma envolvendo o processo de confecção de um item mágico que somente o mago tem condições de decifrar. Algumas aventuras à frente, enquanto o jogador do personagem lutador diz que se aproximará de um grupo de monstros inimigos erguendo os braços e fingindo entregar-se, para distraí-los enquanto o ladino do grupo infiltra-se por uma entrada lateral, o Mestre faz com que o jogador do mago role testes para notar que alguns destes monstros estão dominados magicamente e que parece ter um poder oculto no local.
Mas pense em dezenas de aventuras após isso, e o jogador do mago ainda tomando uma atitude de esperar incentivo do Mestre – ou mesmo dos demais jogadores. Naturalmente, se destacarão personagens dos jogadores pró-ativos, que fazem o que querem e acham sem esperar um acontecimento posto pelo mestre. Se o mago continua sendo o que lança magias quando necessário e analisa itens quando pedido, o ranger agora está com um lobo que decidiu por conta própria buscar em uma floresta e treinar como seu fiel companheiro, o guerreiro agora é o campeão do torneio de arqueirismo do vilarejo Silff – idéia que o jogador sugeriu ao mestre para ocorrer em algum lugar antes do destino final – e o ladino constamente anda oculto e acuado, não por inimigos de guildas que o perseguem, mas por que suas idas constantes atrás de paqueras com garotas das cidades por onde passa desagradou alguns pais...
Percebem que é natural que os holofotes fiquem sobre jogadores que fazem algo por conta própria?
Se em uma sessão o ranger parece se destacar do grupo, não é porque o Mestre queira favorecer o respectivo jogador, mas porque ele ter adotado um lobo abriu um leque de possibilidades de acontecimento, que não precisam ser necessariamente aventuras ou grande desafios. Na sessão em que o ranger ficou mais nos holofotes, isto ocorreu porque o lobo estava sempre inquieto, o que logo se descobriu ser devido à presença de fêmeas de sua espécia nas proximidades (e não a algum lobisomem, como jogadores provavelmente pensariam). Se o grupo teve de fugir às pressas da cidade, não foi porque o Mestre mais uma vez favoreceu o jogador do ladino e ficou interpretando as paqueras dele no jogo, mas porque este atitude pró-ativa fez surgir idéias na mente do Mestre, e logo em um dos vilarejos alguns aldeões se reuniram e decidiram caçar os forasteiros que tem um sem-vergonha no grupo.

Se jogadores não fazem com seus personagens mais do que qualquer outro faz – seu papel nas aventuras e missões-, não teria motivo para reclamar de passar a maior parte da sessão esperando os turnos interpretativos dos demais jogadores. Salvo quando tiver um papel mais importante, em uma ou outra aventura que o Mestre pensou em algo envolvendo o personagem justamente parao jogador participar mais, sua participação no mundo de jogo será a básica, paciência.

Por fim
Ter atitudes pró-ativas não apenas facilita o trabalho do Mestre de criar desafios e acontecimentos relevantes, mas ajuda a movimentar o mundo de jogo e torná-lo um lugar vivo, dinâmico e verossímil. Afinal, ao invés de acontecimentos que surgem mesmo quando os PJs estão parados, muitos surgem em consequências dos seus atos, sejam boas, como vencer um torneio surgido devido a uma idéia sugerida ao Mestre, como ruins, como ter de fugir de uma localidade devido à persequição enfurecida de pais protetores.

Fonte:: http://escudo-do-mestre.blogspot.com/2011/01/jogadores-pro-ativos-e-que-esperam.html#ixzz1mkhZJ9ka